OPINIÃO
Quantificando o subjetivo
Quarta, 20 de julho de 2022
Caríssimo ledor(a), estamos nos habituando a uma nova era: aprendemos a pensar rápido, a responder de prontidão e produzir com intensidade. É quase necessário que cheguemos perto da perfeição para fazer parte do sistema. Tornamo-nos exímios competidores. Quem não seguir o fluxo, fica para trás. Precisamos ser melhores do que os outros para receber as bonificações do emprego e da vida. E somos incentivados o tempo todo a consumir bens e serviços para obter prazer e felicidade. É admirável a coragem daqueles que se livraram de seus bens materiais e iniciaram uma peregrinação apenas para dentro de si mesmos. Acontece que, apesar de ser importante ter dinheiro, ele ainda não compra sentimentos. Aprendi que chega uma hora em que o consumir consome, e acabamos nos perdendo dentro de nossas próprias necessidades e valores. Nos momentos em que esse estilo de vida moderna satura a todos nós, precisamos fugir, ir para outro lugar. Hoje em dia é raridade recebermos uma carta escrita de próprio punho. Algo tão simples, que já foi tão presente na vida das pessoas, praticamente se extinguiu depois da era virtual. A pessoa que me escreveu solicitando que eu explanasse sobre como podemos viver uma vida mais simples e que tenha tudo de necessário para nossa sobrevivência, despertou-me uma grande alegria, um sentimento bastante simplório. Apesar da rotina dos dias, do trânsito caótico e da poluição nos olhos, apesar das distâncias físicas e virtuais, do consumismo acelerado e da inversão de valores da nossa sociedade, ainda encontramos pessoas iguais a nós. Sim, ainda precisamos uns dos outros. Se você sente a vida como eu, seja bem-vindo a essa sensação. Como um amigo que mora do outro lado do oceano me disse: “Ainda não sei se sentir o mundo com mais intensidade nos faz mais felizes ou tristes, mas é algo que vem da alma, não dá para mudar…” É que não podemos mais brecar nossos sentidos e desejos. Talvez muitos não compreendam, pois essas pessoas não veem a vida com os olhos do sentir. Mas nós, seres tidos como perfeitos, inquietos e questionadores, estamos aprendendo a deixar fluir o que vem de dentro: os segredos que não revelamos, os sonhos que desejamos e as histórias que guardamos, porque somos o que sentimos em nós e nos outros, e essa é a maior riqueza que podemos levar conosco. Tudo é passageiro e temporário, ainda que quiséssemos a eternidade, ela nunca estará disponível ao toque de nossas mãos, pois seria uma catástrofe se assim fosse. As melhores coisas da vida estão naquilo que não podemos dominar: aconchega-se na saudade que sentimos, no sofrimento de amor, a dor da partida e principalmente no desapego das prisões sentimentais. Ser feliz com pouco, para mim, nada mais é que amar aquilo que tem, respeitar o que é do outro e desejar tudo que realmente servirá para de alguma forma acrescentar ou preencher em mim o que falta, não para sobrar ou ostentar ao outro, seja pelo simples fato de querer demonstrar uma felicidade em cima da felicidade alheia, coisa que acontece constantemente nas redes sociais, as pessoas criam um submundo onde ali poderá ser feliz o tempo todo, longe de quaisquer responsabilidades ou tristezas, ser julgadores e nunca julgados, olhando por essa perspectiva poderíamos dizer que dentro das redes sociais encontra se um multiverso, um lugar inimaginável, onde, todos são o que queriam ser, pois não poderiam confrontar com a própria realidade. As vezes nos perguntamos se poderíamos viver com pouco, mas a pergunta principal deveria ser, o que seria esse pouco? Como quantificar algo tão subjetivo? O mundo exige muito menos do que imaginamos, nossas frustrações são reflexos de nossas espectativas, isso não é o mundo que impõe, somos nós que realizamos essa cobrança. Ao realizar comparações, anulamos de forma consciente ou não umas das principais dadivas ofertadas de graça e pela graça do nosso criador, a certeza de sermos únicos, ainda que gêmeos, somos únicos, isso deveria ser o suficiente para procurarmos melhorar a cada dia, fazer algo para si e por si, não uma busca de comparações e justificativas para o outro. Podemos ser felizes sem que o outro seja infeliz, somando-nos uns aos outros, dividindo o amor e tendo como saldo a gratidão, viva assim e você não precisará levantar nenhuma bandeira cujo em seu predicado carregue “ismo”, pois a caminhada para derrota individual ou coletiva, nasce através das divisões, seja ela de classes, credo ou raça. Algumas coisas não se podem comprar, ou você ganha, pede ou herda, talvez viver com pouco é apenas aprender a amar aquilo que tem, utilizando da sabedoria e bom senso até mesmo na hora de partilhar com o outro suas próprias conquistas. Ninguém pode ter uma promissória devendo favores incalculáveis para quitação a aquele ou aquela que um dia lhe estendeu a mão. Paz&Bem.
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